terça-feira, 21 de julho de 2009

Duplissonhando...

Era começo de madrugada, na beira da praia, um cigarro aceso e as ondas que tocavam os pés descalços. Nos trejeitos, alguém que já tinha bebido alguma coisa o dia inteiro. A baforada e o olhar contemplativo pro céu que não se via estrelado há um bom tempo por conta da chuva naquela região.

Era uma noite bonita e bastante clara pela lua e pela ausência de luminosidade artificial próxima, que eram intercalados por faróis de automóveis indo e vindo e pelos locais de festa distantes daquele lugar.

Eu olhava pro céu como sempre gostava e há tempos não fazia. Ali, meio bêbado pelo dia todo, ouvi sem me assustar uma voz feminina chamar.

- Que sorriso estranho esse no seu rosto?

Olhei pra cima e a vi, a lua, sorrindo, bem grande, avermelhava o céu de tão intensa. Sorri com sorriso de mostrar os dentes, como se encontrasse alguém há muito querido.

- Quanto tempo não nos falamos?

- É verdade. Um longo período de silêncio e também que não te vejo por aí, desprendido. O que se passa?

- Ah, desprendimento é realmente algo que não está em mim agora. Só ando sonhando sobre meu futuro e tendo que me desfazer de coisas que nem sei como, só sei quando.

- Sonhando sobre o futuro? Interessante. Tem que ter algo de liberdade pra se fazer isso. Pelo visto já tens, o que falta fazer?

- Na verdade, nada. Há muito tempo, me sinto solto por dentro, não consigo me apegar a nada nem a ninguém, é bem verdade. Ando contando com desejos improváveis e sonhos nada reais...

- Sonhos nunca foram muito reais. Tu podes sem problema continuar com eles e viver sossegado.

- É verdade, mas eles têm me tomado tempo por demais. Até que certo ponto posso ficar assim, desejando e sonhando feito louco?

- Até achares que deves. Relaxa, baby.

- Ah, mas a ansiedade tá me devorando. O que vai acontecer depois? Será que posso esperar por isso? E quando chegar, e tudo aquilo que desejei, que sonhei repetidamente que ia acontecer, da mesma forma, com a mesma música, com as mesmas palavras... Os momentos, aqueles momentos, sabe? que te mudam por completo, estão vindo, estão chegando, estão logo ali, depois de virar a esquina. Mas...

- Mas?

- Será?

- Não se sabe. Nunca se sabe. Essas coisas são imprevisíveis. Mas tu já aprendeste como é que funciona tudo isso, não? E eu sei que não tens mais medo de ser sincero até contigo mesmo, o que é mais difícil. Vai fazer as coisas acontecerem e falar abertamente sobre, como tu sempre fizeste. Eu sei que vai.

- É que isso realmente me importa. O nervosismo e ansiedade aqui estão realmente ficando, me fazendo ficar louco, pensando, desejando.

- Deseje, deseje bem. Deseje com a alma, que isso vai te trazer mais pra próximo daquilo que tu és, e o que eu sempre vi. Nada de errado com agora, não. Mas eu sei como és, de verdade.

- Essas coisas se eu falo, ninguém me diz nada, somente tu. Ninguém sabe de ti aí longe e os poucos que conhecem a história realmente não se dão conta do que isso é pra mim, na verdade. Nem tu, acredito.

- Ah, mas sei sim. Apesar de tuas dúvidas e da maior parte do meu silêncio. Sabes que estarei bem aqui, nesse lugar e sabes como chegar até mim.

- Sei que sim. Sei que te verei em breve, ao dobrar a esquina. Posso chegar mais perto, sei sim. E essa é minha grande vontade, sempre foi. Mas fala pra ninguém, não! Já me acham meio maluco no normal, imagine se ficarem sabendo dessas coisas.

- Desejos e sonhos não são para ter vergonha de falar e nem esconder. Podes falar abertamente sobre isso, ainda melhor quando for de noite. As coisas ficam mais fáceis de acreditar. Tou dizendo.

- Ah, a noite. O que seria de mim sem ela? A manhã que me desculpe, mas prefiro a noite. Quando te conheci e quando sempre falo contigo. Por aí, perdido, sozinho no carro, no meio da rua, ou olhando as estrelas na beira de uma praia, não teria coisa que me deixe mais contente do que falar contigo. Talvez seja loucura, e até acredito que seja. Mas não vou deixar de sorrir desta forma aqui e nem de desejar te ver de novo e ficar pensando o que vou te dizer da próxima vez que nos falarmos.

- E quando vai ser?

- Não sei bem ao certo. Mas, logo. Bem em breve...

Sorri e apaguei o cigarro continuando sem saber do futuro, mas aquele sorriso da despedida não se via há tempos.

Um comentário:

VF disse...

"
- Ah, mas sei sim. Apesar de tuas dúvidas e da maior parte do meu silêncio. Sabes que estarei bem aqui, nesse lugar e sabes como chegar até mim"

Essa tua relação com a lua me deixa deveras enciumada