quinta-feira, 3 de abril de 2008

A Luta

De olhos fechados ouvia uma voz ao fundo gritar, contando segundos intermináveis:

- 57! 58! 59! 60!

Tentei abrir os olhos, mas luzes rodavam à minha cabeça, minha vista era embaçada e eu sentia dor, muita dor! No meu rosto, no meu peito, nos meus braços, tudo estava ardendo como se tivesse caído no chão violentamente.

Aos poucos, fui recobrando a consciência, vi que estava deitado sobre um chão frio, úmido, fétido, que as luzes eram na verdade refletores. Tentei sentir meu rosto com as mãos, mas nelas existiam luvas. Luvas? Luvas de boxe!

- Que porra é...?

Quando dei por mim, estava num ringue de boxe, em um galpão velho, mal iluminado além daquele quadrado rodeado por cordas negras e dentro dele havia uma estátua, não gigante, mas bem maior do que eu, uns três metros de altura, diria. Ali, imóvel, impávido, em forma de homem, um bem forte. Não entendia nada, quando percebi de onde vinha aquela voz que contava, e já estava bem adiantado:

- 121! 122! 123! – Um homem careca com a camisa listrada contava gritando.

- Que porra é essa? - Perguntei

- 124! 125! 126! – Continuava sem hesitar.

- Ei, to falando contigo! Que porra que eu tou fazendo aqui?

Nada. Só contava, mexendo o braço, como se me esperasse desistir. Levantei o tronco, fiquei sentado, recuperando as minhas forças, não entendendo o que tava acontecendo ali. Com dificuldade fui me postando de pé e quando finalmente consegui me reerguer, a estátua se moveu, rápido, como um touro, veio em minha direção e me aplicou um soco certeiro no meio da cara com tanta a força, mas tanta força que meus pés levantaram ao cair para trás, de cara no chão, com a boca sangrando, e cuspi alguns dentes. A estátua voltou a ficar imóvel e o careca voltou a contar:

-130! 131! 132!

- AAAHHHHHH!!!

Que dor! Que dor infernal! O que era aquilo, meu deus? Que porra de monstro de pedra é esse? E por que eu tava lutando? Nunca nem briguei no colégio. O que é isso?

A dor me consumia ao mesmo tempo em que o sangue se espalhava pelo chão. Atordoado, sem saber o que fazer, tentei me arrastar pra fora do ringue, mas não consegui. Não podia sair dali. E agora, se eu ficar em pé esse bicho me ataca de novo. O careca já tinha aumentado a sua conta em muitos números e eu ali sem saber o que fazer.

Decidi me levantar de novo e mal cabia em pé e o cara de pedra já me atacava, ferozmente, desferiu jebs, cruzados, diretos e por fim quando cai de joelhos, um golpe nas minhas costas com as duas mãos que mais pareciam um machado.

Levantei mais uma vez e cada vez mais golpes, mais sofrimento sobre meus pés e apanhando muito. Os números se multiplicando e eu ali, caindo pra levantar pra cair de novo. Quanto mais o tempo passava, mais tempo eu conseguia ficar em pé e mais golpes eu levava até não conseguir resistir e ir pro chão de novo. Quando o careca tava lá pelos seus quinhentos e pouco, eu já me jogava no chão de propósito quando não agüentava.

- Meu Deus, como é q eu saio disso? - Fiquei estático, sentindo dor, agora não tinha parte do meu corpo que não estivesse ardendo. Comecei a me desesperar, e agora, o que eu faço?
Aquilo tava me cansando e eu ficava cada vez mais puto, e o cara gritando no meu ouvido só piorava a situação.

- Cala a boca, desgraçado!

Era como se eu não estivesse ali. Continuava. Como um robô.

Sem saída. Sentado. Olhando aquilo acontecer e não acreditando. O que eu tinha que fazer? Enfrentar essa... coisa até eu morrer? Comecei a ficar desesperado, olhar em volta e nada, não tinha absolutamente nada, nem ninguém que pudesse me dar uma luz. Chorando, gritei:

- Por que eu tenho que me levantar daqui? Por quê? Por quê? Por quê? – socava o chão com toda a força do mundo.

De repente, o careca parou de contar.

Encarei. Ele ficou parado, olhar perdido. Sem entender, comecei a sentir raiva. A raiva me subia, transformava-se numa ira fulminante, em ódio, eu gritava cada vez mais alto, até não conseguir mais ouvir meus próprios gritos.

Sem perceber, estava de pé, o monstro de pedra veio em minha direção e eu o encarei. Ele desferiu o golpe em mim e eu me defendi.

Então, senti o braço dele ruir, estalando como um prédio desabando, quebrando em pedaços e o monstro ficou de joelhos. Ficamos cara a cara e com toda a força dei um soco em seu peito que afundou a minha mão e foi rachando seu corpo em pedaços, se desfazendo bem na minha frente.

Exausto, dobrei meus joelhos e apoiei minhas mãos no chão.

Em pé, fora do ringue, o careca suspirou e falou:

- Fim de combate!

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